terça-feira, 26 de setembro de 2017

A Terapia cognitivo-comportamental



Uma diversidade de abordagens da TCC emergiu ao longo das décadas subsequentes, atingindo vários graus de aplicação e sucesso. As TCCs podem ser classificadas em três divisões principais: 1) terapias de habilidades de enfrentamento, que enfatizam o desenvolvimento de um repertório de habilidades que objetivam fornecer aos pacientes instrumentos para lidar com uma série de situações problemáticas; 2) terapia de solução de problemas, que enfatiza o desenvolvimento de estratégias gerais para lidar com uma ampla variedade de dificuldades pessoais; e 3) terapias de reestruturação, que enfatizam a pressuposição de que problemas emocionais são uma conseqüência de pensamentos mal adaptativos, sendo a meta do tratamento reformular pensamentos distorcidos e promover pensamentos adaptativos.
 Há mais de 45 anos, Ellis, originalmente um psicanalista, desenvolveu o chamado modelo ABC, que propõe que qualquer determinada experiência ou evento ativa (A) crenças individuais (B), que, por sua vez, geram conseqüências (C) emocionais, comportamentais e fisiológicas. Ellis também postulou que 12 crenças irracionais básicas, que tomam a forma de expectativas irrealistas ou absolutistas, são à base do transtorno emocional. O objetivo da terapia é identificar crenças irracionais e, através de questionamento, desafio, disputa e debate lógico-empíricos, modificá-las pelo convencimento.
Na TCC, o terapeuta e o paciente trabalham juntos para identificar crenças que a pessoa tem de si e utilizam técnicas que incluem:
·         Questionamento socrático: O questionamento socrático é um dos procedimentos mais utilizados para auxiliar o paciente a realizar descobertas sobre a estrutura do seu pensamento, para flexibilizá-los e mudar crenças rígidas sobre si mesmo, os outros e o ambiente. Na Terapia Cognitiva, o terapeuta não tenta convencer o paciente de que os pensamentos estão incorretos. O terapeuta, através de questionamentos, conduz o paciente para que ele mesmo faça esta descoberta (Descoberta Guiada), buscando explorar os conceitos através dos quais a situação é interpretada bem como as evidências que apóiam e desconfirmam os conteúdos cognitivos. É uma técnica que encoraja o paciente a contemplar, avaliar e sintetizar diversas informações, por meio de perguntas que o levam a pensar e, dessa forma, ter clareza e tomar decisões racionais a partir de suas próprias conclusões.
·         Realização de diários: é solicitado ao paciente que anote em um diário determinada situação, o que sentiu e o pensamento automático que teve. Uma das estratégias usadas na Terapia Cognitivo Comportamental para mudar a forma como nos sentimos e nos comportamos é o registro diário de pensamento disfuncional (RDPD). Nesse registro você identificará os seus sentimentos, os pensamentos que geram esses sentimentos e a partir daí fará um questionamento desses pensamentos. Com esses questionamentos você poderá transformar esse pensamento em um outro pensamento que te favoreça, que te guie a ter sentimentos e comportamentos mais apropriados para lidar com aquelas situações. Quando você muda o seu pensamento, o seu sentimento negativo diminui de intensidade e deixa de te gerar tantos prejuízos ou ainda melhor, gera emoções positivas e comportamentos mais adaptativos.
·         Psicoeducação: a psicoeducação é uma ferramenta ou procedimento usado pelo psicólogo com a função de simplificar a queixa do paciente. O psicólogo demonstra ao paciente a sua patologia em todo o contexto, afim de que o paciente entenda e passe a colaborar ativamente com todo o processo terapêutico. Dessa forma o paciente consegue, durante as sessões de psicoterapia, discutir sobre a sua queixa e encarar de melhor forma seu tratamento. A psicoeducação explica que se o paciente entende a doença e seu processo ele conseguirá agir de modo com que consiga evitar seus sintomas que podem ser expressos em crises, por exemplo. O paciente que entende a doença e seu processo consegue se cuidar melhor.
·         Levantamento das vantagens e desvantagens de continuar e/ou parar com o comportamento inadequado: o terapeuta, juntamente com o paciente, pensarão a respeito das vantagens e desvantagens de continuar ou parar com o comportamento inadequado; assim, o terapeuta sugere para que o paciente escreva em uma folha os pontos negativos e positivos de seu comportamento, afim de que o paciente perceba quão bom ou quão prejudicial está sendo o seu comportamento em sua vida.
·         Seta descendente: A utilização da técnica “seta descendente” é implementada através de uma série de perguntas com o objetivo de descobrir o esquema básico subjacente ( as crenças intermediárias) a partir dos pensamentos de nível mais superficial chega-se a identificar a crença central. Essa técnica é introduzida quando, a partir de um problema apresentado, segue-se perguntando: “Se isso ocorresse, que significado teria para você?”
·         Experimentos comportamentais: as técnicas comportamentais são empregadas, sobretudo, para que o paciente altere algum comportamento de seu repertório e possa, com isso, reexaminar as crenças sobre si mesmo e sobre os eventos, obter evidências factuais para suas conclusões e reformular suas avaliações. Os experimentos comportamentais, em que o paciente é incentivado a modificar as contingências de seu próprio ambiente, são importantes técnicas avaliativas, pois testam diretamente a validade dos pensamentos.

 Modelo cognitivo de Aaron Beck
O modelo cognitivo foi originalmente construído de acordo com pesquisas conduzidas por Aaron Beck, para explicar os processos psicológicos na depressão, em uma tentativa de provar a teoria freudiana de depressão como hostilidade retrofletida reprimida. Ao invés de hostilidade e raiva, a pesquisa sobre os sonhos dos pacientes deprimidos mostrou um “senso de derrota, fracasso e perda”. Os temas de pacientes deprimidos ao dormirem eram consistentes com seus temas em vigília; sonhos poderiam ser simplesmente um reflexo dos pensamentos do indivíduo. Baseado em pesquisa sistemática e observações clínicas, Beck propôs que os sintomas de depressão poderiam ser explicados em termos cognitivos como interpretações tendenciosas das situações, atribuídas à ativação de representações negativas de si mesmo, do mundo pessoal e do futuro (a tríade cognitiva).
As descrições dos pacientes sobre si mesmos e de suas experiências evidenciavam pensamentos e visões negativas de si mesmo, de suas experiências de vida, do mundo e do seu futuro. Beck deu a esses pensamentos o nome de “pensamento automático”, visto que não precisam ser motivados pelas pessoas para vir à tona. Esses pensamentos são o resultado da forma do indivíduo interpretar as situações do dia-a-dia, ou seja, o que fica “gravado” como importante não é o que está acontecendo, mas a visão do indivíduo sobre aquele fato. Tais visões demonstram distorções cognitivas da realidade vivida.
A partir do aprofundamento da origem desses pensamentos automáticos, é possível chegar às crenças centrais do indivíduo, que são as idéias mais fixas e enraizadas, oriundas do processo de desenvolvimento, experiências e formação do individuo desde a infância, aceitas por eles como verdades absolutas. As distorções cognitivas influenciam a resposta emocional, comportamental e fisiológica do indivíduo. Pessoas com transtornos psicológicos com freqüência interpretam erroneamente situações neutras ou até mesmo positivas, ou seja, seus pensamentos automáticos são tendenciosos.
Como conseqüência natural, Beck começou a questionar cada vez mais o modelo de motivações inconscientes da psicanálise e o seu método terapêutico, principalmente a ênfase da psicanálise em conceitualizações motivacionais e afetivas como causa dos transtornos emocionais, que ignoram em grande parte os fatores cognitivos, como foi substanciado por seus achados sobre depressão. Estabelecendo as bases para a teoria e terapia cognitivas, Beck passou a diferenciar a abordagem cognitiva da psicanalítica, focando o tratamento em problemas presentes, em oposição a desvelar traumas escondidos do passado, e na análise de experiências psicológicas acessíveis, ao invés de inconscientes.



REFERÊNCIAS

Beck AT. Thinking and depression. I. Idiosyncratic content and cognitive distortions. Arch Gen Psychiatry. 1963;9:324-33.
 Beck AT. Thinking and depression: II theory and therapy. Arch Gen Psychiatry. 1964;10:561-71.
 Beck AT. Depression: Clinical, Experimental, and Theoretical Aspects. New York, NY: Harper and Row; 1967.
Beck AT. Cognitive Therapy and the Emotional Disorders. New York: International Universities Press; 1976.
Beck AT, Ward CH. Dreams of depressed patients: characteristic themes in manifest content. Arch Gen Psychiatry. 1961;5:462-7.
Dobson KS, Scherrer, MC. História e Futuro das Terapias CognitivoComportamentais. In: Knapp P, editor. Terapia Cognitivo-Comportamental na Prática Psiquiátrica. Porto Alegre: Artmed; 2004.
Dryden W, Ellis A. Rational emotive behavior therapy. In: Dobson KS, editor. Handbook of cognitive-behavioral therapies. 2nd ed. New York: Guilford Press; 2001.
 Ellis A. Reason and emotion in psychotherapy. New York: Stuart; 1962.
 Mahoney MJ. Human change processes: the scientific foundations of psychotherapy. New     York: Basic Books; 1995.


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